sábado, 31 de março de 2018

Expectativas, decepções e aceitação


Caderno de trabalho sufi


Por Mestre Mohammad Abdullah Ansari

Tudo o que vemos, isto é, este mundo material e as coisas que lhe são próprias, é distorcido pelo que temos na cabeça, ou seja, nossas experiências, tendências, crenças, emoções, opiniões, etc. Não vamos ver a realidade deste mundo e entender nossas vidas até adquirirmos o conhecimento de nós mesmos. Podemos, entretanto, ter emoções, crenças e opiniões, mas temos que chegar ao ponto em que podemos ver isso como objetos separados de quem nós somos; são parte do veículo (o corpo) em que habitamos temporalmente durante a viagem pela Terra, por esta vida material. Quando você está numa situação da vida cotidiana, o cérebro está processando em todo momento, comparando e avaliando tudo baseado em experiências passadas, e as emoções estão reagindo e influenciando o cérebro e o corpo. Estar consciente de tudo isso e ao mesmo tempo ver a situação com os olhos do ser real, sua mente (a consciência do coração) é a única maneira de entender a realidade deste mundo.

Em todas as tradições espirituais é dito que o mundo é uma ilusão, não é real. Parte da ilusão a que se referem é o que foi mencionado acima, outra parte é que este mundo é uma criação de Deus feita especialmente como parte de nosso desenvolvimento espiritual – a alma chega aqui incompleta e aqui na Terra e universo material, há tudo o que é necessário para chegar a ver a Deus e entendê-lo em um grau suficiente para continuar nossa viagem espiritual em outra etapa de nossa vida eterna. Segundo alguns caminhos espirituais esta etapa pode incluir muitas vidas, isto é, pode ser que nasçamos várias ou muitas vezes até nos desenvolvermos suficientemente para “escaparmos do ciclo de nascer e morrer”. Ou pode ser que existam outras dimensões ou estados aonde iremos depois da morte do corpo. Em todos os casos, o corpo vai morrer e nós vamos continuar de uma forma ou de outra, e como isso vai ser depende das decisões que tomarmos e o que fizermos durante este período relativamente curto.

Apesar de tudo o que acreditamos ou lemos sobre os fatos desta vida e o que vai acontecer, só existe uma realidade e não vamos entendê-la lendo ou ouvindo o que alguém diz a respeito; temos que experimentá-la por nós mesmos e esse conhecimento vai chegar com trabalho.

Nós queremos tudo do nosso jeito e ai começa a ilusão. Todo o dia temos ideias sobre o que queremos, desde as coisas pequenas como chegar ao trabalho sem problemas e, de repente, você encontra um congestionamento de tráfego terrível, você vai a um restaurante esperando comer tal coisa, o seu prato favorito, e não tem, você tem uma reunião importante e as pessoas chegam muito atrasadas – se você observar atentamente verá que nossas expectativas e desejos, assim como as decepções são muito mais frequentes do que estamos conscientes, de fato, são contínuas todo o dia. As ramificações são tremendas, nos afetam de muitas formas, mental, emocional e fisicamente, sem falar nos danos ao nosso desenvolvimento espiritual.

Trabalho

Nossas expectativas e nossas reações à incerteza da vida são como véus que cobrem a realidade deste mundo, obscurecem a divindade do mundo, confundem nossos sentidos exteriores ou impedem o desenvolvimento de sentidos interiores e a possibilidade de ver através da fachada ilusória da matéria deste mundo para enxergar sua realidade divina, ver a Deus.

A todo instante você espera algo, mas qualquer coisa pode acontecer; não temos que deixar de desejar, mas para abrir o canal do entendimento real e tirar as nuvens que escurecem a visão interna e criam uma ilusão, devemos estar conscientes do que está acontecendo dentro, no cérebro, as emoções, e no corpo, e separarmos deles assim como aceitar as alternativas ou [eventos] inesperados sem reações negativas. De fato, podemos desfrutar qualquer mudança mesmo se for contra nossos desejos ou se nos custar trabalho. Este controle de nós mesmos é essencial para progredir espiritualmente e cumprir com nossa missão na vida. É trabalho de cada momento.

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