Por Sheik Mohammad Abdullah Ansari
“E, EIS ENTÃO que
Abraão falou [assim] a seu pai Asar: “Acaso tens os ídolos como deuses? Em
verdade, vejo que tu e teu povo estais evidentemente extraviados!”
E demos [assim] para Abraão [sua primeira] visão do
magnífico domínio [de Deus] sobre os céus e a Terra – para que fosse dos que
possuem convicção interior.
Quando veio sobre ele a escuridão da noite, viu uma estrela
[e] exclamou: “Este é meu Senhor!” – mas quando se ocultou, disse: “Não amo o
que se desvanece”.
Logo, quando viu a lua sair, disse: “Este é meu Senhor! –
mas quando se ocultou, disse: “Certamente se meu Sustentador não me guia, serei
sem dúvida dos que se extraviam!”.
Então, quando viu o sol sair, disse: “Este é meu Senhor!
Este é o maior [de todos]!” – mas quando este também se ocultou, exclamou:
“Povo meu! Certamente estou longe de atribuir, como vós, divindade a Deus!
Certamente me voltei inteiramente a Aquele que criou os céus e a Terra,
afastando-me de toda falsidade; e não sou dos que atribuem divindade a algo
junto com Deus.” (Corão 6:74-79)
Geralmente estes ayats são entendidos como um aviso contra
associar algo com Deus, um costume de muitas sociedades no passado e, segundo
estes ayats, do próprio pai de Abraão. Ele [Abraão] viu incríveis criações de
Deus, as estrelas, a lua e o sol e sua primeira reação foi comparar essas
criações com Deus (o Rabb em árabe). Mas, o que fez? Ao ver que essas coisas
não eram duradouras, permanentes, que se desvaneciam, concluiu que não podiam
ser o Deus verdadeiro, permanente, sem limites, sem começo e sem fim.
Em tudo o que existe só Deus é permanente e imutável. Deus,
com qualquer nome, é a energia consciente básica de todo o demais, como escrevi
em outro escrito:
“Allah é a fonte de energia que sustém o universo. Se Ele
cortasse a corrente por um segundo, tudo desapareceria. Tudo depende de Allah,
não somos nada, não temos poder, conhecimento, nada. Só com esse entendimento
podemos terminar o reino do ego e desenvolver a humanidade necessária para
romper o apego a este mundo e conectarmos com o Verdadeiro Poder.”
Mas há algo aqui de igual importância que Abraão (a paz seja
com ele) nos mostrou, algo imprescindível, uma prática que todos devemos estar
fazendo continuamente em nossas vidas. Abraão usou seu cérebro, ele analisou a
situação e baseado nos fatos e no seu conhecimento chegou até a verdade. Se
tivesse ficado com apenas as primeiras aparências sua vida teria sido
totalmente diferente.
Deus nos deu um cérebro e consciência por um motivo. O Corão
diz uma e outra vez: “considere isso”, “medite nisso”, “reflita sobre isso”.
Allah, Deus, Yahveh, Brahma, está dizendo: “pensa, analisa, use sua mente”.
Para fazer isso, para pensar, para usar a mente, temos que
conhecer a mente e isso também implica conhecimento de tudo o que impede de
entender e conhecer a mente, isto é, as emoções, pensamentos negativos, medos,
desejos, gostos e desgostos e tudo o que está acontecendo dentro [no interior,
interiormente]. Observando e analisando a tudo.
“O que significa
dhikr (zikr)? Dhikr significa lembrança, nossa prática é dhikr Allah, lembrança
de Allah. O que é Allah (Deus)? É a energia consciente que sustêm a existência.
Onde está essa Força Divina? Dentro de tudo o que existe e isso nos inclui,
Deus reside em cada célula dos nossos corpos. Muito embora, geralmente, o dhikr
se refira à meditação na qual repetimos os nomes de Allah sozinhos ou em grupo
e também durante o dia repetindo frases como ‘Alhamdulillah’, ‘Subhanallah’, ‘Bismillah’,
‘Mashallah’, e etc., mais importante [ainda] – dhikr significa lembrança!
Lembrança implica consciência, estar alerta, desperto. Onde está Deus? Em nosso
corpo, cérebro, olhos, no ar que respiramos...”
“TRANSMITE [aos demais] o que te foi revelado desta
escritura divina, e seja constante na oração, pois, certamente, a oração
refreia [ao homem] das ações desonestas e de quanto atenta contra a razão; e a
recordação de Deus (dhikr) é na verdade o maior [bem]. E Deus a sabe tudo o que
fazeis.” (Corão 29:45)
Você sente a Allah em todo o seu corpo? Para realmente
sentir a Deus em nós mesmos temos que reconhecer a parte ou aspecto de nós que
não é Deus. “Conheça a si mesmo e conhecerá a Deus”, disse o Profeta (a paz
seja com ele). Conhecermos a nós mesmos significa conhecer tudo. Vivemos uma
dualidade. Nosso núcleo é a alma, uma faísca da essência de Deus. Para chegar a
conhecer essa parte de nós, a única parte real, temos que primeiro conseguir
conhecer e dominar a parte que não é real, a parte criada pelas influências
mundanas, pela família e situações da vida, da sociedade e cultura em que
nascemos, nossos medos e apegos materiais assim como também as inclinações
internas herdadas, o DNA. Esse é o ego, uma entidade independente de nossa
verdadeira realidade, uma personalidade falsa que nos desviará do caminho.
Sobre isso escrevi:
“O ego, uma ilusão de quem somos, uma imagem de ser, uma
falsidade criada pelo medo e influências tanto externas como inclinações
negativas interiores, produz uma contração do mundo do indivíduo – uma solidez
física e um encolhimento do mundo da pessoa. Essa contração material inibe o
crescimento do corpo energético, o corpo que vamos habitar na próxima etapa de
nossa existência. Se o corpo energético não se desenvolve neste mundo e nesta
vida pode ser que se estanque para sempre. Para continuar o desenvolvimento da
alma temos que alcançar um grau de desenvolvimento aqui neste mundo primeiro.
Aqui temos o livre arbítrio para escolher. A cada momento a vida nos da opções
para escolher”.
Escolher! Temos livre arbítrio para escolher entre o ego e
Deus. Mas primeiro temos que reconhecer o que é o ego e o que é Deus, ou seja,
qual parte de você está chamando? Onde está o seu foco – no eu, eu, eu, ou em
Deus? Além de Deus estar em nós mesmos, em nossos corpos, está também em todos
os demais – interatuar com o próximo é atuar com Deus indiretamente – cuidado.
O dhikr é estar alerta, observando e analisando-nos, estando
conscientes dos pensamentos e emoções: como são e de onde vem? Quanto mais
pudermos alcançar um conhecimento do que não é nossa realidade, isto é, do ego,
mais nossa realidade, o ser real, começa chegar à superfície, à consciência,
mais nossas vidas serão guiadas por Deus ao invés de pelo ego.
Temos que usar nossa habilidade mental para observar e
analisar tanto a nós mesmos como à vida e nossa parte nela.